Medicamentos e insumos hospitalares são encontrados na área do lixão da capital. Foto: Roraima 1

A denúncia partiu dos próprios catadores de materiais recicláveis que sobrevivem (a contragosto da Prefeitura Municipal de Boa Vista) do espaço em que nada se parece com o anunciado “aterro sanitário”. O lixão, administrado pela Prefeitura da capital, não atende às normas sanitárias preconizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa. Na área, além de lixo exposto, contrariando a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010)  há diversos lotes de medicamentos que foram descartados nas redondezas, sem nenhum cuidado aparente, assim como manda a lei.

A Anvisa tem regras nacionais sobre acondicionamento e tratamento do lixo hospitalar gerado – da origem ao destino (aterramento, radiação e incineração). Estas regras de descarte devem ser seguidas por hospitais, clínicas, consultórios, laboratórios, necrotérios e outros estabelecimentos de saúde. O objetivo da medida é evitar danos ao meio ambiente e prevenir acidentes que atinjam profissionais que trabalham diretamente nos processos de coleta seletiva do lixo hospitalar, bem como no armazenamento, transporte, tratamento e destinação desses resíduos. Nada poderia, em tese, ir parar em um descarte comum.

“Eu tiro meu sustento de lá, apesar deles [fiscais do município] quererem tirar a gente o tempo todo. Vimos os medicamentos e sabemos que tudo pertence à prefeitura, porquê tinham caixas lacradas de creme dental no meio que são distribuídas em kits de higiene nas escolas do município e nos postos de saúde. Muitos catadores, inclusive venezuelanos, levaram grande parte do material embora”, contou uma das catadoras que presenciou o descarte feito por um caminhão de lixo comum, que presta serviço ao município.

Creme dental distribuído nas escolas públicas e postos de saúde do município. Foto: Roraima 1

 

Medicamento só venceria em janeiro de 2020. Foto: Roraima 1

Medicamentos dentro da validade

Há medicamentos no local que ainda estão dentro do prazo de validade. Um lote de Masferol Xarope, utilizado para combater anemia, ainda poderia ser utilizado ao invés de descartado no lixão, já que a validade só termina em janeiro de 2020.

“Foi a primeira coisa que observamos – muito remédio que ainda estava dentro da validade. Isso é caro, custa dinheiro do povo, não deveria ser jogado fora desse jeito. Não sei quem em sã consciência jogaria tanta coisa no lixo assim, ainda mais sabendo que essa não é maneira de fazer as coisas. Eu que nem estudo tenho, sei que não pode jogar esse tipo de coisa no lixo assim, imagine quem estudou e trabalha com isso”, disse.

Segundo denúncia, catadores teriam levado pra casa boa parte do material descartado de forma irregular. Foto: Roraima 1

O que diz a Anvisa

De acordo com a Resolução RDC nº 222/2018, os resíduos de saúde precisam ter o seguinte descarte:

Destinação
Art. 40 – Os RSS que não apresentam risco biológico, químico ou radiológico podem
ser encaminhados para recuperação, reutilização, compostagem,
aproveitamento energético ou logística reversa.

Art. 41 – Os rejeitos que não apresentam risco biológico, químico ou radiológico
devem ser encaminhados para disposição final ambientalmente adequada.

Destinação correta: Devolução ao laboratório ou incineração.

Art. 58 – Os RSS com características de periculosidade, no estado
líquido, devem ser submetidos a tratamento antes da disposição final ambientalmente
adequada.
§ 1º Quando submetidos a processo de solidificação devem ser destinados conforme
o risco presente.
§ 2º É vedado o encaminhamento de RSS na forma líquida para disposição final em
aterros sanitários.

Para o farmacêutico Alan Frade, a prática encontrada nas imagens mostradas pelo Roraima 1 estão completamente fora de acordo das normas estabelecidas.  “São produtos que jamais poderiam ir parar no lixo comum. O correto em termos de saúde pública e o que está previsto em lei é a incineração desse material em local apropriado, por empresas contratadas para tais fins”, explicou.

Ele conta ainda que a esterilização, ao invés da incineração, também poderia ser uma alternativa. No entanto, o seu elevado custo faz com que seja pouco utilizada. “O que podemos afirmar com total segurança é que aí não é o local apropriado para esse descarte. Está tudo fora do que preconiza a legislação”, finaliza.

PREFEITURA DE BOA VISTA – A prefeitura foi acionada para saber de onde vieram esses medicamentos, porquê o descarte está sendo feito de forma irregular, porquê havia medicamentos dentro do prazo de validade sendo jogados no lixo, e quais medidas serão adotadas para resolver o problema. Não obtivemos nenhum retorno.

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