A imigrante venezuelana, identificada pelas iniciais Y.A.G, denunciou à polícia um padre de 60 anos da Arquidiocese Militar de Manaus por crimes de estupro cometidos em maio e junho na capital. A denunciante diagnosticada com Linfoma de Hodgkin – câncer que se origina no sistema linfático – afirma que o sacerdote falava durante e após os crimes que ela seria curada da doença.

A mulher de 29 anos, que também tem Síndrome de Asperger – transtorno de espectro autista – procurou uma delegacia para registrar os casos na última quarta-feira (3), dia que passou também por um exame de corpo e delito no Instituto Médico Legal (IML). Com exclusividade, o Portal A Crítica teve acesso ao documento que mostra detalhes dos relatos da venezuelana sobre os três crimes de estupro que, segundo ela, aconteceram em meses anteriores.

A venezuelana conta no Boletim de Ocorrência (B.O), registrado no 5º Distrito Integrado de Polícia (DIP), que o suspeito utilizou da própria profissão para abusar do seu corpo. A denunciante contou também para a polícia que no momento da ejaculação na sua vagina, o padre gritava: “Deus te ama, Deus te ama!”.

Conforme o B.O, a refugiada e o padre se conheceram em um abrigo da Igreja Católica, localizado na rua José Tadros, no bairro Santo Antônio, local onde Y.A.G ficou por semanas. Ela veio para Manaus, acompanhada do pai, por conta da crise política e econômica na Venezuela. A denunciante destaca que, por telefone, o religioso fazia elogios a ela dizendo que a amava, a chamando de “meu anjo” e “minha flor”.

Crime no dia 18

O primeiro crime de estupro relatado à polícia teria acontecido no dia 18 de maio deste ano, por volta das 10h. A denunciante conta que o padre passou no abrigo, e a convidou para sair. Ela aceitou o convite, mas o homem teria dito que precisava deixar em seu apartamento, localizado no bairro Flores, algumas compras.


Trecho do Boletim de Ocorrência. Foto: Reprodução 

Ao chegar no imóvel, a venezuelana narra no B.O que o sacerdote a ofereceu um suco e, logo em seguida, ela começou a ficar tonta, sem conseguir ter reações ou fazer movimentos.  Depois, Y. A. G, diz que o suspeito a levou até o quarto e colocou uma vestimenta de padre. Neste momento, ele começou a dizer que iria curar a jovem do câncer, passando a tirar a roupa dela.

A refugiada lembra que o sacerdote passou a tocar em suas partes íntimas, deitando em seu corpo no momento em que realizou a penetração vaginal sem uso de preservativo. Ela disse que não teve forças para reagir e que falava para o padre que estava sentindo muitas dores, mas ele continuou cometendo o crime.

Ainda no B.O consta a informação que após o estupro, o suspeito levantou a calcinha da venezuelana e disse para ela guardar a roupa íntima, pois, já que tinha o cheiro dele, ela seria curada do câncer. A mulher relatou para a polícia que, ao chegar no abrigo, começou a sentir muitas dores e no outro dia decidiu ir até o Hospital e Pronto-Socorro 28 de Agosto, localizado na Zona Centro-Sul de Manaus, onde ficou internada durante oito dias.

Pânico de refugiada

Para a polícia, Y. A. G contou que foi abusada sexualmente pelo padre outras duas vezes. A segunda ocasião foi no dia 26 de maio – no mesmo dia que a jovem tinha recebido alta do hospital por ter tido dores depois de sofrer o primeiro crime sexual.

Segundo relato da jovem de 29 anos, o padre a buscou pela manhã, junto com o pai dela, no Hospital 28 de Agosto, os deixou no abrigo, e falou que à tarde voltaria para comprar medicamentos junto com ela. Por volta das 17h, o suspeito passou no local e levou a refugiada até o seu apartamento.

Y. A. G contou à polícia que ficou em pânico, mas acabou tomando um suco oferecido pelo padre e ficou com os mesmos sintomas da primeira vez que ingeriu a bebida. Em seguida, ele colocou um traje com a cor marrom dizendo que aquela era uma vestimenta de cura. Ela conta que mais uma vez, o padre a levou para o quarto e consumou a penetração sem consentimento. Ele também falava “Deus te ama”, na hora da ejaculação na vagina da denunciante.

Novo crime após tratamento

A denunciante relata que no dia 13 de junho – dia do terceiro crime – ela estava em tratamento na Fundação Hospitalar de Hematologia e Hemoterapia do Amazonas (Hemoam), quando o padre passou para buscá-la, tendo ele levado para o próprio apartamento.

A mulher relata ainda que o padre deixou um envelope, com o valor de R$ 550, na secretaria do abrigo para que ela voltasse para a Venezuela. Ela explicou que não iria, pois em seu país natal não tem medicamentos para o tratamento dela.

Ameaças

No boletim de ocorrência, a venezuelana relata também que o religioso a ameaçava para que ela não contasse sobre os crimes ao pai e às autoridades da capital.

Segundo a denunciante, o suspeito falava que ela iria ser expulsa do país e que não teria mais tratamento médico no Brasil, caso ela contasse o que houve, pois ele é Coronel do Exército.


Outra parte do Boletim de Ocorrência que a reportagem teve acesso. Foto: Reprodução 

De acordo com Y.A.G, ela e o pai decidiram sair do abrigo após não aguentar a situação e decidir contar tudo sobre os crimes. Ela completou que o padre seguiu lhe mandando mensagens depois do ocorrido, mas a venezuelana acabou o bloqueando no WhatsApp.

Investigações

Por meio de nota, a assessoria de imprensa da Polícia Civil do Estado do Amazonas informou que o caso foi registrado no dia 3 de julho no 5º Distrito Integrado de Polícia (DIP).

Segundo a PC, a vítima relatou que o padre de 60 anos usou o álibi de que seria curada de um câncer, caso tivesse relações sexuais com ele. A polícia informou que sobre o caso, foi solicitado que a mulher fizesse o exame de corpo de delito.

A PC completou que as investigações sobre o ocorrido seguem em andamento e mais informações não poderão ser repassadas no momento.

Arquidiocese se posiciona

Procurada pela reportagem, a Arquidiocese de Manaus informou que tomou conhecimento do caso nesta sexta-feira (5) e vai tomar as medidas necessárias.

Padre diz que não sabe de nada

Por meio do número que consta no B.O, a reportagem do Portal A Crítica entrou em contato com o padre denunciado pelos crimes de estupro. Por volta das 9h25 desta sexta-feira (5), ele se limitou a declarar que não estava sabendo do caso.

O Comando Militar da Amazônia (CMA) foi procurado pela reportagem e informou que se posicionará sobre o caso por meio de nota a ser enviada em breve.

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