Foto: DPE-RR

Pela primeira vez no Brasil, a população da terra indígena Waimiri Atroari (Roraima/Amazonas) passa gerenciar e a contar com uma unidade avançada defensorial para atender às demandas judiciais de mais de 2.340 povos originários, distribuídos em mais de 70 comunidades.

A Defensoria Pública do Estado de Roraima (DPE) – kinja behe ietypy, pioneira na iniciativa, instalou a Central de Atendimento e Peticionamento Inicial (CAPI), nas dependências do Núcleo de Apoio Waimiri Atroari (Nawa).

Os atendimentos iniciaram desde a solenidade de instalação, no dia 5 de novembro. O Acordo de Cooperação técnica está assinado entre a DPE-RR e a Associação Comunidade Waimiri Atroari (ACWA). A parceria tem a finalidade de realizar ações judiciais para solicitação de Registro Civil, 1° ou 2° via, retificação e alteração de Registro Civil. O acordo terá duração de dois anos, podendo ser prorrogado por igual período.

A CAPI encontra-se nas proximidades do cruzamento da BR 174 com o rio Alalaú. De acordo com o coordenador da frente de proteção etnoambiental Waimiri-Atroari, Marcelo Sousa Cavalcante, grande parte da população indígena ainda não possui o registro de nascimento.

“Nós vemos com bons olhos essa parceria, pois muitos kinja da comunidade têm dificuldade de emitir as certidões de nascimento. Poder expedir essas certidões diretamente de dentro da terra indígena é uma vitória”, disse.

O líder da comunidade indígena, Mario Parwe Atroari, afirmou que a iniciativa facilitará a vida dos povos indígenas, pois quem não tem documento ou necessita modificá-lo poderá emitir na própria comunidade. “Estamos satisfeitos com esse projeto.”

A Associação Comunidade Waimiri Atroari (ACWA) disponibilizou a infraestrutura para implantação da CAPI-Indigena, além do fornecimento de energia solar. Os equipamentos necessários para a execução do projeto no local ficaram na responsabilidade da DPE-RR.

De acordo com o defensor público-geral, Stélio Dener, o trabalho da Defensoria Pública tem sido de suma importância para garantia de direitos aos indígenas do Estado. “A implantação da CAPI na região da comunidade Waimiri Atroari é mais uma conquista para os povos indígenas de Roraima. Sem dúvidas, mais mobilizações como essa serão realizadas para levar cidadania e justiça a quem precisa”, contou.

O subdefensor público-geral, Oleno Matos, acredita que o programa poderá ser estendido para outras terras indígenas de Roraima. “Antes de tudo, tivemos o aval da comunidade para acessar as terras indígenas. Desejamos prolongar essa parceria, a fim de trazer outros acessos à justiça por meio da educação em direitos”, comentou.

A titular da Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem, Elceni Diogo, recorda que a vinda da DPE-RR para o Nawa partiu da Justiça itinerante. “O diferencial é a emancipação dos kinja ao trabalho, ao mesmo tempo que coordenaremos o projeto, eles realizarão todo o atendimento desde a solicitação, requerimento e preenchimento dos dados no sistema SOLAR. Cerca de seis kinja passaram por treinamento”, comentou.

O primeiro atendimento foi a solicitação da certidão de nascimento do pequeno Arson, filho do jovem de 19 anos, Yaha Arson. “Gostei muito do atendimento. Foi rápido e não demorou”, disse.

MYNAWA

Como parte da programação de instalação da CAPI Indígena Waimiri Atroari (WA), a comitiva da Defensoria foi convidada pelo líder da aldeia (Mydy) Mynawa, Sawa, para conhecer de perto o modo de vida dos kinja: culinária, artesanato, língua, produção agrícola, caça, pesca, música e danças próprias da cultura kinja. Grande parte das aldeias tem energia solar.

Os visitantes (kaminja) foram recepcionados por uma dança (maryba) de boas-vindas. Segundo o líder Sawa, hoje são mais de 400 kinja vivendo na Mydy Mynawa, aberta em 1987. Segundo o livro Waimiri Atroari: divulgando nossa história, a aldeia Xara foi aberta em 1986, portanto, sendo a mais antiga.

“A nossa terra indígena sempre será nossa, sempre vamos cuidar da nossa terra e fiscalizar nosso território para não entrarem invasores. Todos os nossos materiais de construção, alimentos, remédios e artesanatos vêm da mata”, explicou o professor indígena Germano, da aldeia Tatii.

As primeiras aldeias dos Waimiri Atroari ficam hoje a duzentos quilômetros de Manaus. No final do século passado ficavam muito mais próximas. O local onde eles vivem é muito rico em produtos naturais e de grande interesse para o extrativismo econômico.

Os WA são kinja ligados diretamente às águas. As aldeias, as atividades produtivas, a cultura e os rituais deles são ligados aos rios. “As atrocidades cometidas contra os kinja maculam o marco histórico do Brasil e é uma grande alegria ver a superação de um povo que se recuperou de tanto genocídio e perversidade. Hoje vive bem e do seu jeito, numa terra conservada e cuidada, realidade que contrasta com os demais povos indígenas do país”, analisou Janaina Tupinambá, integrante da comitiva da DPE-RR.

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