Foto: Felipe Werneck/Ibama

Empresas do grupo Santa Elina, do empresário Paulo Carlos de Brito Filho, desistiram de 95 pedidos de pesquisa mineral em terras indígenas (TIs) após questionamentos do site Repórter Brasil e, com isso, deixaram de liderar o ranking de requerimentos que afetam territórios protegidos.

Reportagem publicada na última segunda-feira (9) mostrou que o conglomerado era o campeão de requerimentos para pesquisar minerais em áreas indígenas, tendo apresentado 255 pedidos junto à Agência Nacional de Mineração (ANM) nos últimos 40 anos, dos quais mantinha 129 processos até março. Os pedidos foram feitos pelas mineradoras Rio Grande, Silvana, Acará, Icana, Irajá, Tarauacá e Apoena, todas ligadas à família de Brito Filho.

Segundo levantamento mais recente da ANM, a primeira leva de desistências ocorreu em 11 de abril – mesmo dia em que a Repórter Brasil enviou um pedido de posicionamento à assessoria de imprensa do Santa Elina. Na ocasião, foram protocoladas 17 desistências de requerimentos de pesquisa e 5 renúncias de processos que já haviam sido autorizados pela agência governamental.

Na resposta a esse primeiro questionamento, o grupo afirmou que abriu mão dos pedidos com “interferência total” em territórios demarcados, mas admitia ter mantido os requerimentos que incidem de forma parcial em TIs, com o objetivo de explorar apenas o entorno (veja a íntegra das respostas aqui).

Duas semanas depois, em 27 de abril, a reportagem enviou novas perguntas à empresa, agora direcionadas ao presidente do grupo, Paulo de Brito Filho. No dia 29, o empresário respondeu afirmando que o conglomerado ia desistir também de todos os pedidos que se sobrepunham parcialmente aos territórios.

O novo levantamento da ANM mostra que o grupo Santa Elina entrou com mais 64 pedidos de desistência no dia 28 de abril. Outros 9 foram protocolados em 3 de maio – último registro disponibilizado pela agência reguladora.

Essas 95 novas desistências correspondem a uma área de 237.363,81 hectares. Descontando também desistências anteriores, pedidos indeferidos pela ANM e autorizações cedidas a outras empresas, o grupo ainda conta com 20 processos em andamento, que totalizam 56.047,92 hectares e afetam oito territórios indígenas nos estados de Rondônia, Amazonas, Mato Grosso, Pará e Roraima. O conglomerado, porém, deixou o posto de campeão em requerimentos.

Em um dos posicionamentos enviados à reportagem, Brito Filho disse condenar “qualquer atividade de garimpo ilegal em terras indígenas”, mas concordar com um posicionamento do setor de 2021, que defende a regulamentação da mineração nessas áreas, “ressaltando o absoluto respeito aos povos indígenas”.

O levantamento da ANM considera todos os requerimentos que afetam as comunidades tradicionais, o que inclui aqueles que se sobrepõem de forma total ou parcial às terras indígenas, além dos situados no entorno desses territórios.

Apesar de a mineração em TIs não ser autorizada por lei, o sistema da ANM mantém tais processos como “ativos”, mesmo quando há desistência por parte da empresa, o que é apontado como uma falha pelo pesquisador Bruno Manzolli, da Universidade Federal de Minas Gerais. De acordo com ele, essas áreas seguem “bloqueadas” para uma nova empresa solicitante, e as companhias com processos em andamento terão a prioridade dos direitos minerários da região, caso a mineração em TIs seja regulamentada.

Em nota, a ANM afirmou que mantém ativos os alvarás concedidos antes da Constituição de 1988, os que se sobrepõem a terras ainda não homologadas e aqueles no entorno das TIs.

Em março, a Câmara dos Deputados aprovou a urgência na tramitação do PL 191/2020, que tenta liberar atividades econômicas em terras indígenas, incluindo mineração. Considerado prioridade pelo presidente Jair Bolsonaro, o projeto de lei foi alvo de protestos e perdeu apoio no Congresso, mas a discussão ainda pode ser retomada.

Os pedidos para pesquisa são a primeira etapa da exploração mineral e a principal atividade das mineradoras de pequeno porte, que costumam vender as minas que prospectam para serem operadas por empresas maiores. Esses protocolos podem gerar uma série de negócios na indústria da mineração, envolvendo investidores estrangeiros, ações na bolsa e paraísos fiscais.

Para coibir essa especulação financeira sobre terras indígenas, o Ministério Público Federal já entrou com diversas ações contra a ANM e contra as mineradoras pedindo a extinção dos requerimentos de pesquisa que impactam esses territórios. No mais recente, na segunda-feira (9), a Procuradoria pediu a suspensão da autorização de exploração mineral na região do rio Negro (AM), conforme noticiou a Folha de S.Paulo.

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