Comércios no bairro 13 de Setembro fixam cartazes para os clientes em "portunhol"

O futuro bem próximo poderá nos reservar uma ingrata realidade, caso nossos políticos e governantes não estiverem atentos ao grande número de crianças e adolescentes na completa ociosidade não só nos bairros de Boa Vista, mas também nas vicinais e vilas do interior do Estado, que inflaram com a migração de venezuelanos, nos últimos anos.

Apesar de qualquer ação que a Operação Acolhida ou as organizações que lidam com os imigrantes ou com direitos humanos realizem por aqui, a maioria dos venezuelanos que migraram para Roraima não voltará mais para o seu país ou irão embora para outro local. Se voltarem para a Venezuela, será apenas para visitarem ou trazerem seus familiares.

A população, e principalmente as autoridades, precisam aceitar e absolver esta nova realidade. Já nos tornamos uma Capital bilingue, inclusive com o comércio no bairro 13 de Setembro, por exemplo, já adotando cartazes com avisos em “portunhol” (mistura de espanhol com português) para orientar sua clientela.

Aceitar a realidade não significa apenas despir-se de preconceitos e xenofobia, que por ventura aflore em algumas situações, como também pensar em políticas públicas para impedir o surgimento de uma realidade que poderá nos custar mais caro ainda: crianças vivendo nas ruas, adolescentes entrando para a marginalidade e, logo em seguida, sendo cooptados para o crime, por meio de facções criminosas.

Muito antes da migração em massa, os governos locais já haviam extinto programas essenciais para encaminhamento e inclusão de crianças e adolescentes nos preparativos para uma vida social integrada ao mercado de trabalho ou mesmo para uma vida de cidadãos plenos. O Governo do Estado, por exemplo, acabou com os programas Jovem Universitário, que pagava bolso de estudo a jovens de baixa renda no ensino superior, e Menor Aprendiz, que oportunizava adolescentes a entrarem para o mercado do trabalho.

A Prefeitura de Boa Vista, por sua vez,  também extinguiu programas importantes do passado, como Meninos do Dedo Verde, que garantia a crianças o aprendizado e a integração com o meio ambiente, e Guarda Mirim, que proporcionava a adolescentes com bom rendimento escolar inclusão ao mercado de trabalho por meio de estágios em órgãos públicos. Todos eles dedicados a famílias de baixa renda.

Sem compromissos com o presente de crianças, adolescentes e jovens, nem com o futuro de nossa sociedade, os governantes acabaram, sem pestanejar, com esses programas que foram responsáveis pela formação do caráter, cidadania e socialização de muitas crianças e adolescentes que estão, hoje, no mercado de trabalho ou com suas formações universitárias concluídas.

Não interessa aos governantes formar bons cidadãos, conscientes de seus deveres e direitos, por isso esses programas deixaram de existir, de uma hora para outra, sem qualquer explicação. O mais curioso é que a sociedade não reivindica  nem as autoridades cobram que essas ações sejam retomadas.

Se programas sociais desse nível não forem recriados e repensados, em um futuro bem próximo os governos serão obrigados a reinstalar programas assistencialistas aos moldes do que era no passado, com gente na fila da cesta básica ou para receber roupas e redes, ou ainda presentes em datas comemorativas.

Pior: teremos uma legião de meninos e meninas em situação de vulnerabilidade social, que pode ser o start para outros graves problemas sociais e econômicos, com um novo estouro da criminalidade, como já vimos em outros tempos de forte migração de garimpeiros de todo o país e de nordestinos que vieram em busca de nova oportunidade de vida.

Se tudo isso não for levado em conta, diante dessa grande recessão que ainda será agravada devido à pandemia, teremos uma realidade sombria em Roraima, difícil de ser contornada, como ocorreu em um passado recente. Superamos vários revezes migratórios, mas este é diferente porque tem muita gente acreditando que os venezuelanos irão retornar ou que não irão se integrar à sociedade.

E este é o grande erro que não pode ser alimentado.

*Colunista

 

 

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